O trabalho remoto virou nossa realidade nos últimos anos e, sim, reorganizamos nossas vidas em torno disso. Para muita gente (inclusive eu!), o home office se transformou em sinônimo de qualidade de vida. Com o distanciamento dos anos de pandemia, no entanto, cada vez mais vemos questionamento sobre os benefícios de trabalhar de casa e uma onde contrária de empresas voltando para o presencial e colaboradores resistentes à mudança especialmente a geração de profissionais que entraram no mercado após 2020. Todos os dias vemos notícias sobre a volta ao presencial, todos os dias vemos profissionais reclamando do quanto é ruim sair do modelo home office para o presencial. Qual, afinal, é o melhor modelo de trabalho?
Para iniciar essa discussão, preciso voltar para quem nos tirou da vida profissional como sempre foi e nos trouxe até aqui: a pandemia, que transformou nossa forma de trabalhar, proporcionando a possibilidade de não gastar horas e horas no trânsito para se deslocar de casa para o trabalho. Mas que também arrancou algo fundamental para o trabalho fluir bem: a convivência no ambiente corporativo. E meu ponto aqui é: entendo que boa parte do que se discute sobre os problemas do home office hoje, passa pelo fato de que os profissionais mais jovens tiveram seu desenvolvimento de carreira afetado porque perderam uma parte fundamental da formação profissionais ao ingressarem no mercado de trabalho durante a pandemia, já trabalhando de casa. E usando esse recorte da discussão presencial x home office que gostaria de explicar porque não acho que nenhum do dois modelos, por si só, façam sentido para o mundo em 2025.
Quem começou a carreira entre 2020 e 2022 ficou privado daquele aprendizado diário que vem da observação, dos pequenos detalhes que a gente aprende por osmose como, por exemplo, etiqueta em uma reunião presencial, como negociar olhando nos olhos do outro, como perceber as nuances de uma conversa que simplesmente se perdem nas reuniões online. Estou convencida de que a comunicação interpessoal presencial é um dos maiores desafios corporativos que já enfrentamos. Fico assustada sempre que constato a quantidade absurda de pessoas que hoje preferem escrever a falar, mandar uma mensagem a ligar.
E aqui vou ser direto: essa tão necessária skill (dialogar falando com outro ser humano) não se aprende em reunião no Teams. Existem habilidades que você simplesmente não desenvolve em uma reunião online. Aqueles gestos sutis, as nuances da comunicação face a face, a arte de conviver, de se posicionar sem ser agressivo, de não se anular em ambientes desafiadores - tudo isso fica absolutamente comprometido quando nos limitamos a WhatsApp, e-mails e videochamada.
E aqui, caio no que minha geração e as demais vêem e reclamam da genZ. Boa parte das questões que nos desafiam como gestores dos jovens vem justamente do fato de que eles, , ao entrarem no mercado durante uma pandemia, foram privados dessas lições que as telas não mostram.
E, sinceramente, tenho dois pontos sobre isso: 1) não acho justo e entendo o sentimento de indignação da GenZ quando eles são cobrados de algo que eles não aprenderam, mesmo que seja óbvio na nossa cabeça (na deles não é); e 2) Tenho uma preocupação ENORME com o o problema que teremos num futuro próximo com toda uma geração de profissionais sem habilidades para se relacionar dentro do ambiente de trabalho presencialmente. Sabemos que as IA’s vão ocupar todas as atividades que podem ser automatizadas e que sobrará para o ser humano ocupar as posições criativas e que demandam relacionamento interpessoal.
Diante dessa realidade, o home office e a falta do aprendizado sobre como se relacionar com pessoas pode criar uma tragédia profissional para uma camada significativa de profissionais que, sem terem essa vivência, perderão oportunidades profissionais consideráveis em um mundo no qual relacionamento interpessoal e comunicação serão as skills mais importantes.
Dito tudo isso, como resolver o problema? Eu sei que a resposta natural seria "vamos voltar ao que era antes, claro!". Mas não é. Como bem disse Heráclito (e adoro citar isso): "ninguém entra duas vezes no mesmo rio". E aqui o que quero dizer é uma vez experimentamos algo novo, o que era nunca mais será o que foi. Em termos práticos, seria miopia da minha parte ignorar os claros benefícios da flexibilidade de trabalhar de casa, especialmente depois de anos moldando nossa vida ao redor do home office. Um retorno total ao presencial seria um choque brutal. A verdade é que nossas rotinas foram completamente redefinidas na primeira metade dessa década e temos um desafio enorme de definir como deve ser o formato de trabalho.
Nas acaloradas discussões sobre o retorno ao presencial, não compro nem o 8 nem o 80 - prefiro o 40! Não acredito que as empresas terão ganhos extraordinários de produtividade voltando ao modelo gerencial pré-pandemia (correndo o risco de perder talentos dependendo da área), mas também estou convencida de que o modelo 100% remoto prejudica tremendamente as soft skills ligadas à comunicação e relacionamento interpessoal, especialmente dos profissionais em início de carreira.
NPor isso, vejo no modelo híbrido esse equilíbrio necessário. Um formato que permite aquela troca de olhares insubstituível, os aprendizados espontâneos do cafezinho, mas que também reconhece que vida e trabalho não precisam estar em eterna guerra. Afinal, não somos robôs produtivos - somos pessoas completas!
Ressignificar o trabalho exige que entendamos profundamente como mudamos enquanto sociedade nos últimos anos. Precisamos urgentemente resgatar os benefícios da convivência corporativa para enfrentar os problemas crescentes da falta de interação social presencial, enquanto incorporamos as novas demandas que surgiram. É ingenuidade e saudosismos acreditar que podemos simplesmente voltar ao que era antes. A cultura presencial pré-pandemia morreu, mas temos a extraordinária oportunidade de construir algo melhor - um modelo que incorpore todos os aprendizados da digitalização acelerada e que reflita o espírito do nosso tempo. Em lugar de perder tempo tentando voltar ao que não é possível, está na hora de olharmos para o que podemos ser.